A Decisão de Libertar Terrenos em Áreas Protegidas: Um Caminho Necessário ou um Risco?

por Susana Lucas
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Recentemente, o Governo português anunciou a intenção de libertar terrenos em 61 áreas protegidas para projetos de construção. Esta medida, enquadrada num esforço para responder à crescente crise habitacional e à pressão urbanística em várias regiões do país, tem gerado uma onda de reações – desde preocupações ambientais até questões éticas e sociais.

Embora o objetivo seja claro – fomentar o acesso à habitação e dinamizar a economia –, a decisão levanta uma questão fundamental: a que custo?

O que está em jogo?

As áreas protegidas foram definidas, ao longo das últimas décadas, como zonas de elevado valor ambiental, cultural e paisagístico. Muitas delas albergam espécies ameaçadas, habitats únicos e ecossistemas essenciais para a regulação climática, a purificação da água e a preservação da biodiversidade.

Ao abrir mão de parte destes territórios para a construção, não estamos apenas a alterar a paisagem; estamos a desafiar o equilíbrio frágil entre o desenvolvimento humano e a proteção ambiental. Será possível avançar com uma estratégia de construção sustentável sem comprometer irreversivelmente os valores naturais destas áreas?

As justificações do Governo

O Governo tem defendido que os terrenos a libertar serão escolhidos com critérios rigorosos para minimizar o impacto ambiental. No entanto, os detalhes sobre como este processo será conduzido e monitorizado permanecem vagos.

Além disso, argumenta-se que estas medidas são cruciais para responder à escassez de terrenos disponíveis em áreas urbanas e para aliviar a crise habitacional, particularmente para as camadas mais jovens da população, que enfrentam dificuldades crescentes para aceder a uma habitação digna e acessível.

O dilema ético e ambiental

Por outro lado, ambientalistas e especialistas têm expressado sérias reservas. A libertação de terrenos em áreas protegidas pode abrir precedentes perigosos, comprometendo décadas de esforços de conservação. Para muitos, esta decisão reflete uma abordagem a curto prazo, em que as necessidades imediatas prevalecem sobre a sustentabilidade de longo prazo.

Se há algo que a crise climática nos tem ensinado é que o impacto das nossas decisões de hoje terá repercussões inevitáveis no futuro. Será que estamos prontos para enfrentar as consequências de uma possível erosão da biodiversidade, da perda de recursos naturais e do aumento da vulnerabilidade às mudanças climáticas?

O caminho para o equilíbrio

Para que esta medida não seja apenas mais um exemplo de “solução rápida” com custos elevados, é essencial que seja implementada com total transparência e com a colaboração de especialistas de várias áreas, incluindo urbanismo, biologia e sociologia. Além disso, deve haver uma aposta forte em alternativas sustentáveis, como:

  • Requalificação de espaços urbanos degradados, aproveitando áreas já urbanizadas e devolutas;
  • Incentivo à construção em altura e ao uso eficiente do solo em locais com menor impacto ambiental;
  • Recuperação do parque edificado habitacional do estado que existe um pouco por todo o lado, tanto relacionado com atividades como guardas florestais entre outros, a casas que foram construídas em zonas urbana (lembro-me do que vejo em Peniche) para quem veio das ex-colónias, que agora aprece com diversas casas emparedadas;
  • Políticas que promovam o equilíbrio entre habitação e proteção ambiental, como a habitação cooperativa e modelos de economia circular.

A libertação de terrenos em áreas protegidas é um tema que exige um debate profundo e informado. Embora as necessidades habitacionais sejam uma prioridade legítima, é imprescindível que as decisões tomadas hoje sejam pensadas para o bem-estar das gerações futuras.

Afinal, qual é o preço justo de um teto quando está em jogo o futuro do nosso património natural?

 

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