Num curto espaço de tempo, Valência foi palco de chuvas intensas que deixaram a cidade e arredores em alerta máximo. Imagens de ruas alagadas, trânsito interrompido e prejuízos generalizados mostraram a força dos elementos naturais e a nossa vulnerabilidade enquanto comunidade urbana. Mas a verdade é que fenómenos como este são, em grande parte, um resultado direto da forma como ocupamos e alteramos o ambiente em redor.
Valência, situada numa zona mediterrânica, tem as suas fragilidades naturais. O clima, marcado por períodos de seca e chuvas intensas concentradas em curtos espaços de tempo, torna a região particularmente vulnerável a inundações. Com terrenos que nem sempre absorvem facilmente grandes quantidades de água e uma topografia que favorece o escoamento rápido, esta zona necessita de pensar e projetar tendo em conta a imprevisibilidade do clima.
Contudo, a crescente urbanização – com novos edifícios, pavimentos impermeáveis e alterações ao traçado natural dos cursos de água – tem comprometido a capacidade da cidade de “respirar”. Ao substituirmos áreas naturais por construções, retiramos ao solo a capacidade de absorver água, e a água que não pode ser absorvida encontra o seu caminho, muitas vezes, nas ruas, nas casas e nos espaços que usamos no dia-a-dia. Além disso, rios e cursos naturais têm sido desviados e canalizados para permitir o crescimento urbano, mas, como se vê nas cheias, a natureza insiste em funcionar segundo as suas próprias regras, recordando-nos que estas intervenções têm limites.
Este tipo de ocupação humana traz, inevitavelmente, um impacto significativo para a comunidade. Por um lado, contribui para que cada chuva intensa seja mais destrutiva, por outro, revela as falhas na forma como temos planeado as nossas cidades, sem respeitar o funcionamento natural do ambiente. Valência não é uma exceção, mas sim um exemplo claro de um fenómeno global: a tentativa de adaptar a natureza às nossas necessidades sem considerar as consequências.
As chuvas recentes são um aviso para repensarmos o nosso planeamento urbano. Será que estamos a construir cidades que respeitam a natureza ou que apenas respondem a uma procura imediata? Podemos imaginar uma Valência onde a ocupação do solo seja mais responsável, com áreas verdes pensadas para absorver águas pluviais, com espaços de escoamento natural e com uma convivência mais harmoniosa entre o urbano e o natural.
A natureza continua a funcionar, com ou sem nós. Cabe-nos a nós decidir se queremos respeitar o seu ritmo ou sofrer as consequências da nossa interferência. Que as chuvas em Valência sejam um ponto de partida para refletirmos sobre um futuro mais sustentável e em maior sintonia com o nosso planeta.