Extinção da FCT e da ANI: Que futuro para a ciência e inovação em Portugal?

by Susana Lucas
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A recente decisão do Governo de extinguir a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e a Agência Nacional de Inovação (ANI), fundindo-as numa nova agência para a investigação e inovação, tem gerado uma onda de preocupação na comunidade científica portuguesa. O anúncio foi feito sem auscultação prévia dos principais intervenientes do sector, o que contribuiu para um clima de incerteza e desconfiança em relação ao futuro da ciência em Portugal.

A nova estrutura, ainda pouco detalhada, promete integrar a ciência e a inovação sob uma mesma entidade. No papel, a intenção poderá parecer lógica — promover uma maior articulação entre investigação científica e aplicação prática. No entanto, na prática, levanta sérias dúvidas.

Ciência sem tutela governamental direta?

Com esta reestruturação, a ciência deixa de ter uma presença directa e autónoma em qualquer estrutura ministerial, o que simbolicamente (e politicamente) representa um retrocesso. A ciência, que deveria ser pilar estratégico do desenvolvimento do país, arrisca tornar-se uma área periférica, diluída numa lógica de inovação económica e tecnológica que nem sempre contempla o valor da investigação fundamental.

A ausência de uma tutela clara levanta uma questão essencial: quem vai defender, no seio do Governo, os interesses da comunidade científica e a necessidade de financiamento estável e previsível para a investigação?

Um contexto já fragilizado

Esta decisão surge num momento particularmente delicado. A FCT, apesar das suas limitações e críticas recorrentes, era ainda assim o principal órgão de financiamento e avaliação da ciência em Portugal. A sua última avaliação aos centros de investigação foi alvo de forte contestação, com a maioria das unidades a verem as suas classificações reduzidas. Isso traduziu-se em cortes de financiamento, com impacto directo na capacidade dos centros para realizar investigação, contratar pessoal e manter projectos de longo prazo.

A sensação de desvalorização é generalizada: para muitos investigadores, parece que o Estado está a desmantelar o pouco que ainda funcionava, sem oferecer garantias sobre o que virá a seguir.

Inovação sem investigação?

É importante sublinhar que não há inovação sustentada sem uma base sólida de investigação científica. A criação de uma agência focada em inovação pode ser positiva se não negligenciar o apoio à ciência fundamental, que é, muitas vezes, a origem das grandes transformações tecnológicas e sociais.

A preocupação da comunidade científica é legítima: sem estruturas claras de financiamento e avaliação, sem representação política efectiva, e sem diálogo com quem faz ciência no terreno, o país corre o risco de comprometer o seu desenvolvimento a longo prazo.

Um apelo à participação e à transparência

Mais do que nunca, é essencial que a comunidade científica, as universidades, os institutos de investigação e até os cidadãos exijam clareza, diálogo e participação neste processo de reformulação. A ciência não pode ser gerida à porta fechada. O conhecimento é um bem público, e o seu futuro deve ser construído com todos.

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