A Inteligência Artificial (IA) está a transformar o mundo, trazendo avanços incríveis na medicina, na automação e até no combate às alterações climáticas. No entanto, enquanto a atenção do público muitas vezes se concentra na pegada de carbono das tecnologias, há uma questão igualmente alarmante que começa a emergir: o consumo de água necessário para treinar e operar sistemas de IA.
De centros de dados gigantescos a modelos de IA como o GPT e o ChatGPT, o custo hídrico desta revolução tecnológica está a tornar-se uma preocupação crescente, especialmente num contexto de crise global de escassez de água. Mas o que significa isto, na prática?
IA e a Água: Qual a Ligação?
Para compreender a relação entre a IA e o consumo de água, é essencial olhar para os centros de dados onde estas tecnologias operam. Estes centros alojam milhares de servidores que consomem enormes quantidades de energia. Para evitar o sobreaquecimento, utilizam sistemas de arrefecimento intensivos, e muitos deles dependem diretamente de água para este fim.
Segundo estudos recentes, os modelos de IA consome milhões de litros de água. Por exemplo:
- Um modelo de IA como o GPT-3 (utilizado em muitas aplicações de IA) pode consumir tanta água quanto a necessária para produzir dezenas de carros ou milhares de refeições.
- O uso diário de ferramentas de IA também contribui para esta pegada hídrica, especialmente em plataformas que requerem servidores em funcionamento constante para responder a utilizadores de todo o mundo.
Exemplos do Consumo de Água pela IA
Um relatório recente da Universidade de Colorado Riverside e da Universidade de Texas aponta que o treino de modelos de IA como o GPT-3 consome aproximadamente 700.000 litros de água, quando se considera o ciclo completo de treino e funcionamento. Este valor refere-se à água utilizada no arrefecimento dos centros de dados, especialmente em climas quentes, onde a evaporação aumenta o consumo.
Além disso, cada interação com a IA – como fazer perguntas num chatbot – também tem um custo hídrico. Embora o consumo por consulta seja pequeno, quando multiplicado pelos milhões de utilizadores diários, o impacto torna-se significativo.
Porquê Preocupar-se Agora?
A crescente adoção de IA está a acontecer ao mesmo tempo que o mundo enfrenta uma crise global de escassez de água. Segundo a ONU, cerca de 2 mil milhões de pessoas já vivem em áreas com stress hídrico severo.
A expansão da IA levanta várias questões éticas e práticas:
- Concentração de consumo em regiões vulneráveis: Muitos centros de dados estão localizados em regiões que já enfrentam desafios no acesso à água, agravando a pressão sobre as comunidades locais.
- Escalabilidade: À medida que mais empresas adotam IA, a quantidade de água necessária para suportar estas tecnologias pode tornar-se insustentável.
- Impactos indiretos: Além do consumo direto, o aumento da procura por IA intensifica a necessidade de construção de infraestruturas adicionais, que também consomem recursos hídricos.
A Solução Passa pela Eficiência?
Grandes empresas tecnológicas, como Google, Microsoft e Amazon, que lideram o desenvolvimento de IA, estão cientes do problema e já implementam algumas soluções, como:
- Uso de água reciclada para arrefecimento.
- Otimização da eficiência energética, reduzindo a necessidade de arrefecimento constante.
- Transferência de operações para regiões mais frias, onde o arrefecimento com ar é mais eficiente e o consumo de água é menor.
No entanto, estas iniciativas ainda não resolvem o problema em escala global, e a questão do impacto hídrico permanece como um dos maiores desafios associados à IA.
O Lado Ético da Tecnologia
O debate sobre o consumo de água pela IA também toca em questões éticas fundamentais: será justo priorizar recursos hídricos para o funcionamento de tecnologias avançadas enquanto milhões de pessoas carecem de acesso básico a água potável?
Embora a inovação tecnológica seja essencial para o progresso, é crucial garantir que estas soluções sejam desenvolvidas de forma sustentável e inclusiva. A transparência sobre o consumo de recursos e a adoção de medidas para mitigar impactos ambientais são passos necessários para evitar que a IA se torne um fardo adicional para o planeta.
A Inteligência Artificial é, sem dúvida, uma das ferramentas mais poderosas da atualidade, mas o seu impacto ambiental – e, em particular, hídrico – não pode ser ignorado. Para garantir que a IA beneficia a humanidade sem comprometer os recursos essenciais, é necessário repensar a forma como estas tecnologias são desenvolvidas e implementadas.
O futuro da IA deve ser não apenas inteligente, mas também sustentável. Afinal, enquanto podemos construir modelos cada vez mais avançados, não podemos criar mais água.