Fala-se muitas vezes das dificuldades de fazer ciência por falta de financiamento. E sim, essa é uma barreira real, que afeta desde a aquisição de materiais até a contratação de pessoas. Mas há outras fronteiras menos visíveis, mais silenciosas, que bloqueiam o avanço da investigação de forma igualmente poderosa: as competências que nos faltam, mas que são esperadas de nós.
Hoje em dia, o perfil do investigador expandiu-se. Já não basta ter uma boa ideia, dominar o tema ou conhecer os métodos clássicos da área. Espera-se também que saibamos programar, analisar dados complexos, gerir projetos, comunicar para públicos diversos, submeter candidaturas altamente competitivas, dominar ferramentas digitais, cumprir regras de ética, publicar em revistas indexadas, e ainda… ensinar, orientar, colaborar, inovar e divulgar. Tudo isto, muitas vezes, sem formação formal nestas áreas.
Não se trata de falta de vontade. Trata-se de um sistema que pede cada vez mais, com cada vez menos apoio estruturado. A verdade é que muitos investigadores se vêem a aprender por tentativa e erro, a correr atrás de saberes técnicos e metodológicos fundamentais, mas que não foram parte da sua formação base. E isto traz insegurança, frustração e até bloqueio: como produzir ciência de qualidade quando nos faltam as ferramentas para a fazer bem?
Há, também, um lado estrutural: a pressão por resultados rápidos não dá espaço para aprender com tempo. A colaboração interdisciplinar, tão valorizada, esbarra muitas vezes em barreiras linguísticas (e não só no sentido literal), onde cada área fala num “dialecto científico” próprio. A expectativa de ser “excelente em tudo” gera uma cultura de exaustão mais do que de inovação.
A ciência precisa de financiamento, sim — mas precisa também de um reconhecimento real da complexidade das competências envolvidas. Precisamos de:
- Tempo e espaço para aprender o que não sabemos;
- Redes de apoio e formação contínua;
- Valorização da colaboração, onde competências diferentes se somem em vez de serem exigidas a cada indivíduo isoladamente.
Produzir ciência é, cada vez mais, um trabalho de equipa — mesmo quando a carreira académica ainda insiste em promovê-la como uma maratona solitária.
Falar destas barreiras é um passo importante. Não para nos lamentarmos, mas para abrir espaço para uma prática científica mais realista, colaborativa e humana.
